Ouço, em mim,
O canto aflito, escondido,
Persistindo em não se abrir,
Inspiração a querer fugir.
Difícil, num tempo sem beleza,
Permeado por tantas tristezas,
Encontrar razão para cantar,
Para o meu canto sorrir.
E o canto da própria dor,
De tanto, apenas na garganta, eclodir,
Vai-me, também, abandonando,
Escondendo-se, temeroso,
Passo a passo, a esvair-se.
Contudo, a este tempo tirânico,
A querer apagar-me o direito
De cantar e ser feliz,
De mostrar o que há de melhor, em mim,
Encaro e grito: Continuo, aqui!
E, com a alma em conflito,
Cercada pelo tempo triste, perdido,
Luto, a reestabelcer, num grito,
O sonho de ser o que eu sempre quis.
E, por entre preleções fingidas,
vazio e espaços sem fim,
Manifesto o meu canto, grito,
Àqueles que, também, cantam:
Sigam-me!
Desafio flechas velozes
do desamor, a me perseguir,
Acelero o meu olhar de águia, a voar,
Pois, na velocidade das minhas asas,
Não poderão me alcançar.
Alcançarei, então, as montanhas,
Ao emergir-me desse mar
E pousarei no lugar mais alto,
Outra vez, o meu sonho, em mim
A cantar, cantar e cantar.